Cata-ventos Lunares: outubro 2008

Depois da Chuva Quente, Nova de Outubro de 2008.

À Senhora de voz rouca:


Vou a qualquer canto, e meus olhos humedecem. Pareço estar em todos os lados que olho. Me perdi no que sinto, tenho medo e não o tenho. Durmo e me vejo além. Olho meu corpo deitado ao lado de outro. Assusto-me em me ver, e me aconchego na companhia do outro olho. O sono está em pedaços, tem horas que já não sei mais o que fazer, e me encolho, e morro dentro de mim.

Não sei se tenho forças na ausência. Tudo se repetindo. Cruzo corpos antigos, envelhecidos, certa de que todos sofremos por brincar de entrega.

O gozo é alvo e respira breve. Eu que envelheço, e me torno cada vez mais insegura. Não era isso que eu imaginava. Pensava que amar de novo me deixaria mais calma, mais honesta com tudo.

Li um texto lindo de Priscilla, quase me roubou o ar. Chorei, pois... o que mais haveria de ser? Calor e frieza num mesmo toque. Soberba e embriaguez. Me vejo em cada palavra, só que agora há defesa. E de novo me recolho.

Ele saiu pela mesma porta de antes. Rindo, indiferente. Talvez leve. Eu não consegui mais dormir.

Penso agora que não tenho mais porquê me preservar, mas não tenho forças de me entregar aos silêncios, às esperas, às mentiras.

Talvez mártir, talvez judas. Brindemos ao equívoco!

De quem te olha pelos cantos

Eliane Rubim

Cristalina e negra, Minguante de Outubro de 2008.

Caro No-sense:

Repensamos o projeto Caos. É possível. Não importa o que tenha à tua volta. O amor sempre te amará.









Essa carta são citações. Tudo roubado, sem referências, pois penso: como referenciar se tudo faz parte do mesmo lugar, da mesma teia de acontecimentos, encontros e frequências.

No-sense, não comecei a pensar reto, de forma alguma, penso sinuosa, às vezes contraditória e hipócrita. Sou hipócrita por muitas vezes desconsiderar a memória coletiva, e inventar uma só minha. Agora me responda: Can you see? All the hearts that touch your cheek.

Eu não consigo... Parece cada dia mais claro os afetos e os desafetos por mim. Acho bom não ser alguém apático. Acho bom desaprender (e me desprender) das formas "padrão". Descobri que é preciso cada vez mais sutileza...

Quero te contar do meu convívio com os surdos. Não sei... bem por onde começar. Tenho a sensação que eles ouvem demais, e isso gera esse silêncio da escuta. Eles ouvem demais, e se comunicam, desesperados, através desse silêncio (que é só deles).

No começo eu tinha outras sensações, mas agora sinto isso mais presente, esse silêncio que nos aproxima.

Everybody bow your head
For the greatest inspiration
A complete contradiction
Of ways.

In this hole that we have fixed
We get further and further
For what we must do
I know this, I know this

You know this, you know this



Os dias são grandes. Grandiosos. Das flores, que no esgoto eram margaridas, agora na água podre do meu lar, são dentes de leão. Essas coisas me fascinam. O podre, a sujeira, a beleza, a transformação, a falta de sentido (aparente).

É no silêncio que trocamos...

De quem conversa contigo nas horas de entrega

Eliane Rubim.

Desvio, Crescente de Outubro de 2008.

às flores do esgoto:

sei de tudo. do ir e do vir... dessa eterna maré de cios e clios e ciclos intermináveis de rasgos, desencontros, fissuras, amores.
sei tudo.

as paisagens de cavalos selvagens. nossas pernas quebradas por buracos negros. meu corpo cansado e pesado. mas o ar entra direto. sem vias, sem cruzes e tubos de respiração. o ar me invade o peito: limpo e pleno.

as flores do esgoto

todo mal-ar. sei de tudo. o olhar ganha desvio na água. ora verde, azul, branca. depende do sol, do vento, depende da maré.

as flores do esgoto são pegajosas. se agarram aos meus pés que em ciclos passeiam.



é doce pestanejar em espaço aberto.

da sua

lili.